» Marianna De Camargo Cancela, Pesquisadora da Divisão de Pesquisa Populacional do Inca
» Liz Maria De Almeida, Gerente da Divisão de Pesquisa Populacional do Inca
» Ana Cristina Pinho, Diretora-geral do Inca
O significativo impacto do câncer sobre o paciente, a família e os custos para o sistema de saúde é bem conhecido. Mas o impacto na economia do país devido aos óbitos prematuros de pessoas economicamente ativas tem passado despercebido. Estudo publicado na revista Cancer Epidemiology calculou o peso desses óbitos na economia de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (os Brics), quantificando a perda de produtividade em cada país devido à morte de pessoas entre 15 e 65 anos. Foi o primeiro trabalho a avaliar esse aspecto nos países em desenvolvimento — fruto de colaboração da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (Iarc, na sigla em inglês), da Organização Mundial da Saúde, com uma equipe global de pesquisadores, da qual o Inca fez parte.
O custo total da perda de produtividade devido à mortalidade prematura por câncer representou 0,33% do Produto Interno Bruto combinado dos Brics, em 2012, o equivalente a R$ 147,2 bilhões. O cálculo foi baseado no número de óbitos anuais para estimar os anos de vida produtiva perdidos entre a morte por câncer e a idade de aposentadoria em cada país. Foram empregados dados nacionais e internacionais sobre salários, desemprego e participação na força de trabalho.
A China foi o país com a maior perda de produtividade (US$ 28 bilhões), enquanto a África do Sul teve o custo mais alto por morte por câncer (US$ 101.000). No Brasil, o custo das mortes foi de aproximadamente R$ 15 bilhões e, se nada for feito, a tendência é de que a cifra continue a aumentar, tendo em vista o desenvolvimento econômico e as mudanças de estilo de vida que resultaram no aumento significativo das doenças crônicas não transmissíveis, entre as quais o câncer.
As perdas de produtividade total foram maiores, no Brasil, para o câncer de pulmão, seguido pelos tumores de mama, estômago, cólon, reto e sistema nervoso central. Essa distribuição exemplifica o momento de transição epidemiológica pelo qual o país passa, quando tumores de origem infecciosa continuam a ter impacto, como o câncer de estômago e o do colo do útero, além da presença de tumores típicos de países desenvolvidos, como mama, cólon e reto.
Os tumores que resultaram na maior perda de produtividade por morte foram testículos, sarcoma de Kaposi, nasofaringe, faringe e lábios/cavidade oral. Os resultados indicam perdas anuais de produtividade de R$ 1,3 bilhão no Brasil devido ao tabagismo (83,3% das mortes no sexo masculino e 64,8% das mortes no sexo feminino por câncer de pulmão são atribuíveis ao tabagismo), embora a política nacional de controle do tabaco, implementada nas últimas três décadas, tenha resultado na diminuição do número de fumantes em cerca de 50%. A forte redução indica que, ao contrário dos outros Brics, as perdas de produtividade relacionadas ao tabagismo provavelmente não aumentarão no futuro em nosso país.
As taxas crescentes de obesidade no Brasil respondem por mais de 2% dos casos de câncer em homens e quase 4% em mulheres. Os cânceres de estômago e de fígado não estão associados a altas perdas de produtividade nos países desenvolvidos, mas causam impacto importante na Índia, na China e no Brasil, onde as prevalências de Helicobacter pylori, HPV e o vírus da Hepatite B (HBV) são elevadas.
Esse estudo ressalta a necessidade de estratégias específicas para reduzir a carga econômica do câncer nas economias em desenvolvimento. O foco no controle do tabagismo, na dieta adequada, no controle do peso, na atividade física, nos programas de vacinação e rastreamento do câncer, combinado com o acesso ao diagnóstico e ao tratamento adequado e oportuno, pode gerar ganhos significativos tanto para a saúde pública quanto para a economia dos países dos Brics.
Fonte: Correio Braziliense (DF)